Explodem casos de racismo e xenofobia contra brasileiros na Europa e clamor internacional faz com que governos e instituições se pronunciem e lutem para combater a discriminação e o ódio contra estrangeiros

O racismo cometido contra o jogador brasileiro Vinicius Junior, do Real Madrid, no último final de semana em um jogo válido pelo campeonato espanhol é só o reflexo de uma sociedade contaminada pelo ódio e pelo preconceito que não se restringe somente ao racismo, mas à discriminação sexual, religiosa e, em muitos casos, à xenofobia, que é o medo, aversão ou a profunda antipatia em relação a estrangeiros. Em Portugal, na semana passada, um grupo de 50 estudantes brasileiros se uniu para protestar contra o problema. O ato foi motivado após denúncias apontarem possível discriminação ocorrida na faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em abril deste ano. Segundo as denúncias, um dos alunos da instituição, Hélder Semedo , que é português, teria insinuado que os brasileiros não possuem capacidade intelectual, e que deveriam ser apedrejados. Semedo atua como conselheiro no Conselho Geral da Universidade de Lisboa. No caso das agressões sofridas por Vinicius Junior, a polícia espanhola anunciou as primeiras detenções após forte clamor internacional.
Em Portugal, a denúncia de xenofobia também ganhou repercussão negativa na imprensa portuguesa. Esse não é o primeiro episódio de xenofobia contra alunos do Brasil a ser investigado na Universidade de Lisboa. Em 2019, um grupo colocou uma caixa com pedras no saguão da Faculdade de Direito junto a um cartaz onde dizia: ” grátis para atirar em um zuca”, referindo-se ao termo “brazuca”, como são chamados os brasileiros em Portugal.
Em 2022, a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial apontou um aumento de 505% dos casos de xenofobia contra brasileiros em Portugal. Ao mesmo tempo, a quantidade de imigrantes brasileiros também cresce em Portugal. Dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras do país apontam que o número de estrangeiros subiu no país pelo sétimo ano consecutivo, sendo que a comunidade que mais cresce é a brasileira (aumento de 21%) em 2022 em relação ao ano anterior.
VÍTIMA: O advogado brasileiro Pedro Cabrini Marangoni, de 23 anos, mora há oito meses em Lisboa -mudou-se em setembro do ano passado, e diz ter sido vítima de xenofobia em dois episódios sofridos fora da universidade. Ele foi um dos organizadores do manifesto em Lisboa. Como saldo da manifestação, Marangoni diz que conseguiram o pronunciamento da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa (AAFDL) , além de medidas de apuração disciplinar da conduta do agressor. Foi também criado o Comitê Popular dos Estudantes com o objetivo de defender os interesses dos universitários brasileiros em Portugal. Apesar de não ter sofrido nenhum ato xenofóbico na universidade, Marangoni diz ter passado por duas situações constrangedoras.

Na primeira vez, Marangoni conta que havia ido com alguns amigos catalães numa boate de Lisboa e estava na fila aguardando para entrar quando um segurança português deu um recado em voz alta para que se organizassem melhor. Então, ele traduziu em inglês, também em voz alta, as instruções aos amigos, e por isso o segurança se aproximou dele e lhe disse :”Por acaso, eu sou algum palhaço para você ficar me imitando? Estás a gozar comigo?”. Marangoni diz que tentou explicar a situação e ficou por último na fila sendo que os amigos foram permitidos entrar antes dele. Quando chegou sua vez de entrar, o mesmo segurança, juntamente com outros dois companheiros não queriam deixá-lo entrar. “Eles disseram que eu não sabia me comportar e que era comum que pessoas como eu agissem dessa forma. Condicionaram meu ingresso à boate a um pedido de desculpas ao segurança. Assim, desarmado, prossegui e entrei”.
Em outra situação, ele aponta que estava com outros dois brasileiros para entrar numa casa noturna e o segurança os barrou sob o pretexto de não estarem seguindo o “dress code” (código de vestimenta) ainda que não estivessem fora da norma. “Vimos que os mesmos seguranças deixaram outros rapazes (talvez belgas ou alemães), com roupas análogas às nossas, entrarem na sequência”.
ABAIXO ASSINADO CONTRA A XENOFOBIA https://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR132184
POLÍCIA ESPANHOLA DETÉM 7 ACUSADOS DE RACISMO CONTRA VINICIUS JR

A polícia espanhola anunciou na manhã de hoje (23 de maio), a prisão de sete torcedores após um novo episódio de racismo contra Vinicius Jr – três deles pelos insultos racistas na partida entre Valencia e Real Madrid, e os outros quatro pela simulação de enforcamento com um boneco que usava a camisa de Vini Jr em janeiro deste ano-. As prisões foram motivadas, principalmente pela repercussão negativa a nível internacional após o jogo do último domingo em Valência. Vale ressaltar que este não foi o primeiro caso de racismo contra o jogador brasileiro (veja outras agressões).
O caso também repercutiu negativamente no governo espanhol. O atual presidente Pedro Sánchez usou as redes sociais para se pronunciar sobre o tema. “Tolerância zero com o racismo no futebol. O esporte se fundamenta nos valores da tolerância e respeito. O ódio e a xenofobia não cabem no nosso futebol e nem na nossa sociedade”, ressaltou.
Em reunião do G7, o presidente Luis Inácio Lula da Silva fez uma declaração pública condenando o racismo sofrido pelo jogador brasileiro. “Fica aqui o meu gesto de solidariedade a um jogador brasileiro, jovem e negro. Ele foi fortemente atacado sendo chamado de macaco. Não é possível que quase no meio do século XXI o preconceito ganhe força em vários estádios da Europa. Não é justo que um menino pobre que venceu na vida e pode ser um dos melhores jogadores do mundo seja ofendido em cada estádio que jogar. É necessário que a Fifa , que a Liga espanhola e de outros países tomem providências. Não podemos permitir que o racismo e o fascismo tomem conta dos estádios”.
REVISTA FÓRUM TRADUZIU DECLARAÇÃO DO TÉCNICO DO REAL MADRID APÓS OS ATAQUES A VINICIUS JUNIOR
Carlo Ancelotti, o vitorioso técnico do Real Madrid, concedeu uma áspera entrevista após o jogo. O caso repercutiu de forma devastadora mundo afora e o italiano não poupou os jornalistas espanhóis, que queriam “falar sobre futebol”.
“Você quer falar de futebol, ou falamos de outra coisa? Eu não quero falar de futebol… Eu quero falar do que aconteceu aqui… Acho que isso é o mais importante… Isso é mais importante que uma derrota, você não acha? Eu estou muito calmo e tranquilo, mas isso que aconteceu hoje é uma coisa que não pode acontecer… E isso é totalmente evidente… Um estádio grita “macaco” a um jogador, e então o treinador pensa em substitui-lo por isso, tem algo muito errado nesta liga… Sim, claro (se perguntou a Vini Jr se ele queria continuar), e ele não queria continuar… Depois eu lhe disse que não me parecia justo que ele deixasse a partida, porque isso não era sua culpa… (Disse a ele) Você não é o culpado, você é a vítima! E ele seguiu jogando… E depois, além disso, deram a ele um cartão vermelho sem sentido, porque não foi uma agressão… Então, dito isso, nós temos um problema… Bem, eu não tenho, porque para mim Vinicius é o jogador mais importante do mundo, mais forte do mundo… A liga tem um problema… Isso foi um episódio de racismo… Para mim, tem que parar a partida, não pode continuar, porque não era uma pessoa, que grita “macaco”, “macaco”, como acontece em muitos estádios… Aqui é um estádio que insulta um jogador por racismo, e então a partida tem que parar… E eu diria o mesmo se ganhássemos de 3 a 0… Tem que parar a partida, não há outra maneira… Porque a imagem é muito ruim… Começaram a insultá-lo desde o primeiro minuto… Um estádio fez insultos racistas, um estádio completo… Vamos ver o que acontecerá… Eu estou muito curioso para ver o que acontecerá”, disparou um sisudo e ríspido Ancelotti, para perplexidade dos repórteres.
FONTE: REVISTA FÓRUM
CRONOLOGIA DO RACISMO CONTRA VINICIUS JUNIOR
- Barcelona x Real Madrid (24/10/2021)
Torcedores gritaram “macaco” para Vinícius Junior no Camp Nou. LaLiga apresentou denúncia à Procuradoria de Ódio de Barcelona. Os autores dos ataques não foram identificados e o caso foi arquivado.
2. Mallorca x Real Madrid (14/03/2022)
Foram ouvidos sons imitando macacos das arquibancadas do estádio Son Moix. LaLiga abriu nova denúncia, que foi arquivada, segundo à Procuradoria de Ódio local, porque “a expressão e os sons emitidos, indubitavelmente típicos de atitudes profanas e desprezíveis, bem como vexatórios e absolutamente rejeitáveis, não parecem abranger inicialmente, para o presente caso, a dimensão penal pública que se postula”.
3. Atlético de Madrid x Real Madrid (18/09/2022)
Nos arredores do estádio Wanda Metropolitano, antes do clássico, vários torcedores gritavam “Vinícius você é um macaco, você é um macaco”. Novamente LaLiga apresentou denúncia que foi arquivada. “Não há ato específico para imputar a uma pessoa específica e, uma vez contextualizados os insultos racistas, não constituiriam um crime contra a dignidade de a pessoa. E isso pelo fato de serem desagradáveis, inoportunos e desrespeitosos, pois foram derramados por ocasião da celebração de uma partida de futebol de máxima rivalidade, com outras alusões depreciativas ou zombeteiras marcadas por aquela competição esportiva, juntamente com sua natureza de que não se repetiram além dos dois atos expostos e que duraram alguns segundos”, disse a Procuradoria de Ódio de Madrid.
4. Valladolid x Real Madrid (30/12/2022)
Alguns torcedores chamaram Vinícius Junior de “negro bastardo” e “negro m…” no estádio José Zorrilla. A partir deste caso, LaLiga trocou de estratégia e apresentou denúncia em três frentes: na Comissão Anti-Violência, na Comissão da Competição e diretamente no Tribunal de Valladolid. Vários responsáveis pelos insultos foram identificados e o processo penal foi instaurado. O clube de Ronaldo Fenômeno abriu processo interno com 11 identificados e retirou seus ingresso da temporada.
5. Real Madrid x Atlético de Madrid (26/01/2023)
Antes do clássico, válido pela Copa do Rei, Madri acordou com um boneco, com a camisa de Vini, pendurado numa ponte simulando o enforcamento de Vinícius Junior. LaLiga apresentou uma queixa ao Tribunal de Instrução de Madri. O processo segue em andamento para identificar responsáveis.
6. Mallorca x Real Madrid (05/02/2023)
Mais um ataque racista no estádio Son Moix. Um torcedor gritou “macaco” para Vinícius Junior. O caso foi relatado novamente e o processo foi aberto. Através de um vídeo no TikTok, o autor foi identificado. Ele já havia proferido ataques racistas ao jogador “Chukwueze dias antes. Ele perdeu a carteira de sócio por três anos. Além disso, a Comissão Anti-Violência impôs uma multa de R$ 22 mil e um ano de banimento de qualquer instalação esportiva.
7. Osasuna x Real Madrid (18/02/2023)
Insultos racistas foram proferidos contra o brasileiro no estádio El Sadar. Os atos foram denunciados pela LaLiga perante os tribunais de instrução de Pamplona. Os autores ainda não foram identificados.
8. Betis x Real Madrid (05/03/2023)
Gritos de “macaco” foram dirigidos a Vinícius Junior nas arquibancadas do estádio Benito Villamarín. LaLiga apresentou denúncia ao tribunal investigativo de Sevilha após detectar o autor dos insultos.
9. Barcelona x Real Madrid (19/03/2023)
Mais uma vez no clássico contra o Barça gritos de “macaco” e “morra” para Vinícius Junior foram ouvidos nas arquibancadas do Camp Nou. O caso foi denunciado nos tribunais de instrução de Barcelona.
10. Valencia x Real Madrid (21/05/2023)
No domingo, Vini acusou parte da torcida do Valencia de chamá-lo de “macaco” no segundo tempo. O jogo chegou a ficar paralisado por cerca de oito minutos. Nos minutos finais, o brasileiro foi expulso após confusão com o goleiro Mamardashvili.


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