Livres para voar, sonhar e viver

Vera diz que a idade não a impede de lutar e de buscar seus sonhos. “Não posso ver uma tiroleza que me atiro”.

Aos 60 anos, ela decidiu mudar de área e não se importou e muito menos se deixou abater com possíveis críticas ou rejeição que pudesse sofrer devido à idade, pelo contrário, sua determinação e força de vontade serviram como um combustível para que ela conduzisse as rédeas de sua jornada permitindo-se mudar de rota sem nenhum problema. Em uma entrevista exclusiva ao blog “Desejo de viver” falei com a consultora de carreira carioca Vera Regina do Carmo Mendonça, de 64 anos, sobre um tema bastante delicado: o etarismo (preconceito contra as pessoas por causa da idade), que voltou a ser debatido no Brasil após um vídeo de três universitárias de uma faculdade de Bauru, interior de São Paulo, viralizar na internet por elas criticarem o fato de terem uma colega de turma com 40 anos. “Os mais jovens têm o domínio de coisas que nós mais velhos não temos; por outro lado, nós temos a experiência e a maturidade que os jovens ainda não dominam”, justificou.

Segundo ela, o intercambio intergeracional (que se realiza entre duas ou mais gerações), pode ser o caminho para uma igualdade de condições no mercado de trabalho. Vera acredita que essa discussão precisa ser mais ampla e trabalhada em família e nas escolas despertando um esforço na sociedade para o equilíbrio dessa situação. “Eu percebo, infelizmente, muitas pessoas com dificuldade de encontrar trabalho por causa da idade. Só que isso é um número. Hoje, uma pessoa de 60 anos pode pensar e atuar tranquilamente como alguém de 40. Temos vários exemplos de idosos, com 70, 80 anos atuando em suas profissões com maestria. Precisamos evoluir como sociedade”, destaca. Jovem de espírito, corpo e alma, além de hiperativa convicta, ela conta que gosta de fazer atividades físicas, como pilates e caminhadas e que não pode ver uma tirolesa que é a primeira a se candidatar para a aventura. Fazer trilhas, por exemplo, é um hobby que adquiriu após os 55 anos. Vera confessa que se sente muito viva, disposta e aberta aos novos desafios que a vida tem a lhe oferecer, e que nunca é tarde para recomeçar. “Eu creio que todas as pessoas têm o direito de realizar seus sonhos e que tudo acontece no momento certo”.   

Os exercícios físicos fazem parte de sua rotina diária de atividades e que a ajudam manter a mente ativa.

Recentemente, tivemos no Brasil uma situação explícita de etarismo das três jovens universitárias de Bauru (interior de São Paulo). Como você viu esse episódio?  

Vera: Esse caso de Bauru me deixou muito impactada por ver justamente no meio acadêmico pessoas preconceituosas e desrespeitosas. Isso para mim também passa pela educação que receberam em suas famílias e até da ideologia que seguem. O tema dá inúmeras vertentes para discussão. Eu não passei por esse tipo de preconceito, mas já vi outras pessoas passando por isso e fiquei muito incomodada. Eu acredito que isso deva ser muito abordado porque a população está envelhecendo. O índice de natalidade está caindo e daqui um tempo as empresas terão obrigatoriamente que contratar pessoas mais velhas. Eu confio muito nesta troca intergeracional.

 Como era a Vera na infância e adolescência?

Vera: Vim de uma família simples de origem mineira. Meu pai foi para Volta Redonda, no Rio de Janeiro, quando a companhia Siderúrgica Nacional foi criada na década de 1950. Depois se casou e trouxe minha mãe e tiveram quatro filhos. Minha infância foi muito tranquila. Morávamos em um bairro de periferia. Meu pai trabalhava bastante e a responsabilidade pelo cuidado dos filhos era de minha mãe. O contato com meu pai acontecia aos domingos. Minha maior lembrança era dos passeios de bicicleta que fazíamos juntos.  Sempre fui uma criança estudiosa e isso seguiu pela adolescência e depois na idade adulta. Não era de me “enturmar”, mas tive uma vivência muito interessante ao participar de um grupo de jovens na igreja católica. Foram muitos aprendizados que levei para a vida adulta e também para a profissional. O gosto pelas ciências humanas saiu dali.

No passado, você teve apoio da família para estudar?  

Vera: Ir para a faculdade foi uma história complicada. Meu pai era machista do tipo: “Minha filha só sai de casa quando estiver casada”.  Tive que usar muitas estratégias para que ele deixasse eu ir para a Capital estudar. Até o padre teve que interferir. Estudei no Rio de Janeiro por quatro anos. Naquela época não havia a facilidade de comunicação que temos hoje. Não tínhamos nem telefone em casa. Meu pai apesar de aposentado, precisou continuar trabalhando para pagar os estudos dos filhos. Eu cumpria religiosamente suas regras porque não queria perder a oportunidade de estudar. Assim, conclui o curso e retornei para minha cidade. Meses depois, eu consegui meu primeiro emprego, como prestadora de serviço numa clínica para atendimento a crianças com deficiência. Logo em seguida, me casei. Demorei um tempo para ter filhos e acabei tendo três. Tenho também uma “filha de coração” que eu digo que adotei e que me deu uma afilhada-neta.

E o que a fez escolher sua primeira profissão?

Vera: Foi por acaso. Eu estava no ensino médio e sabia que queria ter uma profissão, mas na minha cidade naquele momento eram pouquíssimas as opções. Então, fiz um curso técnico em secretariado e na disciplina de psicologia tive a oportunidade de ler sobre a profissão de assistente social. O que estava escrito me tocou e naquele momento defini que era aquilo que eu iria fazer. Não conhecia ninguém da área e muito menos sabia se havia campo de trabalho em minha cidade, mas a escolha já estava feita. Como minha família não tinha muitos recursos, ao mesmo tempo em que concluía o ensino técnico, eu me preparava para o vestibular estudando com apostilas que foram fornecidas pelo meu namorado na época (com quem estou casada há 42 anos) e pelos meus colegas do grupo de jovens da igreja. Eles faziam cursinho e quando criavam grupos de estudo me chamavam para participar. Assim, fui aprovada no primeiro vestibular que fiz.

Você teve uma trajetória profissional intensa. Como avalia seus trabalhos anteriores?

Foi muito diversa. Atuei no serviço privado e no serviço público, me especializei na área de saúde onde atuei na assistência e depois fui para funções gerenciais. Fiz diversas especializações e um mestrado em saúde coletiva. Tive uma experiência maravilhosa também na docência superior. Devido ao meu mestrado em saúde coletiva, lecionei duas disciplinas na graduação do curso de enfermagem, e em cursos de pós-graduação. Uma coisa que sempre fiz durante minha vida profissional foi desenvolver pessoas. No serviço público, atuei na área de recursos humanos, coordenando um setor de Treinamento e Desenvolvimento de Pessoas. Depois, eu deixei o serviço publico e fui para uma organização do terceiro setor gerenciar a área de saúde. Permaneci nesta instituição por 15 anos. Me aposentei, mas continuei trabalhando.

O que te fez mudar de opinião e querer mudar de área e quais foram as razões para essa mudança?

Vera: Após um período, eu resolvi parar de trabalhar. Na verdade, deixar o compromisso do vínculo formal para ter mais liberdade e fazer outras coisas que gostaria de fazer e que não tinha tempo. Meu marido já estava aposentado. Tenho ainda minha mãe que é idosa e necessita de cuidados, e eu sou a única filha que mora em sua cidade. Só que aposentar de vez nunca esteve em meus planos. Meus filhos e meu marido dizem que ninguém me aguentaria em casa sem que eu estivesse trabalhando. Acho que o gosto pelo trabalho herdei de meu pai. Ele faleceu aos 87 anos e sempre muito ativo.

Como você se sente na área que trabalha atualmente?

 Vera: Quando penso em tudo que vivi profissionalmente eu vejo que sempre contribui para o desenvolvimento de pessoas. Em alguns momentos exercendo formalmente as atividades de recursos humanos e informalmente, pois nos cargos gerenciais que exerci e mesmo na atividade docente, sempre tive a oportunidade de incentivar o crescimento  e o desenvolvimento profissional das pessoas. Por isso, quando decidi deixar o trabalho formal e atuar como consultora, a primeira coisa que fiz foi me preparar. Iniciei fazendo uma formação em coach, depois busquei mentorias até encontrar meu nicho. Hoje descobri que o que realmente gosto de fazer é atuar como consultora de carreira.

Vera não teve receio de mudar de área e recomeçar. “Se prepare, planeje e vá à luta. Vale muito a pena!”.

Que mensagem você deixaria para outras pessoas que assim como você sonham em mudar de vida, de área e muitas vezes se bloqueiam por causa da idade?

Vera: Uma coisa que nunca permiti em minha vida é ser bloqueada, nem por mim nem pelas pessoas. Eu acredito que nós devemos ser quem nós quisermos e fazermos o que quisermos. É claro que as histórias pessoais e as oportunidades são diferentes.  Nunca é tarde para nada.  Então se não estudou, se quer mudar de área ou empreender busque as condições para fazê-lo. Se prepare, planeje e vá à luta. Vale muito a pena!

ESTUDANTE HOSTILIZADA GANHA BOLSA DE ESTUDOS NA INGLATERRA

Patricia Linares, estudante hostilizada, no curso de Biomedicina, feliz após saber da bolsa de estudos na Inglaterra

Na semana passada foi anunciado pelas redes e comemorado em todo país a notícia de que a estudante de biomedicina Patrícia Linares, de 45 anos, vítima de etarismo, em uma universidade de Bauru (interior de São Paulo), havia ganhado uma bolsa de estudos na Inglaterra. O anúncio foi feito por Patrícia em um vídeo publicado numa mídia social. “Você que está pensando e não tem coragem, é seu sonho e você não quer por causa da idade, vamos fazer o seguinte? Idade não nos define. Idade é um número, então vamos colocar nosso sonho para correr que a vida não espera”, disse.

Patrícia trabalhou como comerciante durante a maior parte de sua  vida e decidiu fazer a graduação em biomedicina após ter que fechar sua loja de roupas na pandemia. Desempregada, teve de recalcular os planos para o futuro. A escolha do curso se deu por influência da mãe, enfermeira ao longo de toda a vida. “Meu sonho de estudar na área da saúde sempre existiu. Tinha essa vontade desde menina”, contou.

ENTENDA O CASO : Em março deste ano, uma publicação de três estudantes da sala de Patrícia gerou indignação e comoção pública. No vídeo, uma delas ironiza: “Gente, quiz do dia: como ‘desmatricula’ um colega de sala?”. Logo na sequência, outra jovem responde: “Mano, ela tem 40 anos já. Era para estar aposentada”. “Realmente”, concorda a terceira com deboche. No dia seguinte, as três estudantes não foram à faculdade. Ao mesmo tempo, alunos da sala de Patrícia e de outros cursos foram até ela demonstrar solidariedade. Após a repercussão negativa do episódio, as três alunas que zombaram de Patrícia desistiram do curso. Um processo disciplinar por parte da Unisagrado foi instaurado para averiguar o caso.

Vídeo de universitárias debochando de colega de 40 anos viralizou na internet (Fonte CNN)

(Com informações da Agência Estado e CNN Brasil)

Jornalista, roteirista, escritor e ator brasileiro com mais de 20 anos de experiência em comunicação.Vivo atualmente em Barcelona onde trabalho como correspondente internacional, mas já morei em outros países, como Portugal, Irlanda, EUA e Itália onde sempre estive envolvido com projetos na área de comunicação- minha grande paixão-.Como roteirista, destaco a coautoria na sinopse e no 1 capítulo da novela "O Sétimo Guardião" (TV Globo/2019), o documentário "Quem somos nós?", sobre exclusão social, e o curta-metragem "As cartas de Sofia".Como repórter, trabalhei em grandes grupos de comunicação no Brasil, como RBS, RAC e RIC. Ganhei o prêmio Yara de Comunicação (categoria impresso) em 2013 com uma reportagem sobre as diferentes famílias e histórias de vida às margens do rio Piracicaba (SP). Fui finalista do prêmio Unimed de Jornalismo/SC com uma reportagem sobre gravidez precoce.

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